29 de Novembro de 2011 às 20:06
Claudio Tognolli_247 – Com a epígrafe citando a
clássica frase É preciso solidarizar-se com “as ovelhas rebeldes”, a
Associação Juízes para a Democracia emitiu nesta terça-feira um duro
comunicado contra a a reitoria da USP. No documento, a entidade
estabelece que segmentos da sociedade, que ostentam parcela do poder
institucional ou econômico, com fundamento em uma pretensa defesa da
legalidade, estão fazendo uso, indevidamente, de mecanismos judiciais,
desviando-os de sua função, simplesmente para fazer calar os seus
interlocutores e, assim, frustrar o diálogo democrático”.
Trata-se de um sutil golpe contra o reitor da USP, Grandino Rodas,
cujo nome foi construído no mundo do direito e, sobretudo, no da
magistratura. A entidade deixa claro o descontentamento contra a
presença de forças policiais no campus da USP, no Butantã, para debelar
focos de estudantes amotinados. E contra comportamento análogo adotado
pela reitoria da Unicamp. Veja a íntegra da nota:
A ASSOCIAÇÃO JUIZES PARA A DEMOCRACIA - AJD, entidade não
governamental e sem fins corporativos, que tem por finalidade trabalhar
pelo império dos valores próprios do Estado Democrático de Direito e
pela promoção e defesa dos princípios da democracia pluralista, bem como
pela emancipação dos movimentos sociais, sente-se na obrigação de
desvelar a sua preocupação com os eventos ocorridos recentemente na USP,
especialmente em face da constatação de que é cada vez mais frequente
no país o abuso da judicialização de questões eminentemente políticas, o
que está acarretando um indevido controle reacionário e repressivo dos
movimentos sociais reivindicatórios.
Com efeito, quando movimentos sociais escolhem métodos de
visibilização de sua luta reivindicatória, como a ocupação de espaços
simbólicos de poder, visam estabelecer uma situação concreta que lhes
permita participar do diálogo político, com o evidente objetivo de
buscar o aprimoramento da ordem jurídica e não a sua negação, até
porque, se assim fosse, não fariam reivindicações, mas, sim, revoluções.
Entretanto, segmentos da sociedade, que ostentam parcela do poder
institucional ou econômico, com fundamento em uma pretensa defesa da
legalidade, estão fazendo uso, indevidamente, de mecanismos judiciais,
desviando-os de sua função, simplesmente para fazer calar os seus
interlocutores e, assim, frustrar o diálogo democrático.
Aliás, a percepção desse desvio já chegou ao Judiciário trabalhista
no que se refere aos “interditos proibitórios” em caso de “piquetes” e
“greves”, bem como no Judiciário Civil, como ocorreu, recentemente, em
ação possessória promovida pela UNICAMP, em Campinas, contra a ocupação
da reitoria por estudantes, quando um juiz, demonstrando perfeita
percepção da indevida tentativa de judicialização da política, afirmou
que “a ocupação de prédios públicos é, tradicionalmente, uma forma de
protesto político, especialmente para o movimento estudantil,
caracterizando-se, pois, como decorrência do direito à livre
manifestação do pensamento (artigo 5º, IV, da Constituição Federal) e do
direito à reunião e associação (incisos XVI e XVII do artigo 5º)”, que
“não se trata propriamente da figura do esbulho do Código Civil, pois
não visa à futura aquisição da propriedade, ou à obtenção de qualquer
outro proveito econômico” e que não se pode considerar os eventuais
“transtornos” causados ao serviço público nesses casos, pois “se assim
não fosse, pouca utilidade teria como forma de pressão”.[1]
Ora, se é a política que constrói o direito, este, uma vez
construído, não pode transformar-se em obstáculo à evolução da
racionalidade humana proporcionada pela ação política.
É por isso que a AJD sente-se na obrigação de externar a sua
indignação diante da opção reacionária de autoridades acadêmicas pela
indevida judicialização de questões eminentemente políticas, que
deveriam ser enfrentadas, sobretudo no âmbito universitário, sob a égide
de princípios democráticos e sob o arnês da tolerância e da disposição
para o diálogo, não pela adoção nada democrática de posturas
determinadas por uma lógica irracional, fundada na intolerância de
modelos punitivos moralizadores, no uso da força e de expedientes
“disciplinadores” para subjugar os movimentos estudantis
reivindicatórios e no predomínio das razões de autoridade sobre as
razões de direito, causando inevitáveis sequelas para o aprendizado
democrático.
Não é verdade que ninguém está acima da lei, como afirmam os
legalistas e pseudodemocratas: estão, sim, acima da lei, todas as
pessoas que vivem no cimo preponderante das normas e princípios
constitucionais e que, por isso, rompendo com o estereótipo da
alienação, e alimentados de esperança, insistem em colocar o seu ousio e
a sua juventude a serviço da alteridade, da democracia e do império dos
direitos fundamentais.
Decididamente, é preciso mesmo solidarizar-se com as ovelhas
rebeldes, pois, como ensina o educador Paulo Freire, em sua pedagogia do
oprimido, a educação não pode atuar como instrumento de opressão, o
ensino e a aprendizagem são dialógicos por natureza e não há caminhos
para a transformação: a transformação é o caminho."
Fonte: Home Brasil 247.
Nenhum comentário:
Postar um comentário