quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Slavoj Zizek: "A liberdade da internet é falsa"

Um dos pensadores mais polêmicos da atualidade,
o filósofo esloveno diz que a sociedade digital é dominada por
empresas e que nela não há democracia

O filósofo esloveno Slavoj Zizek escolheu um lugar inusitado para gravar a entrevista para um documentário em São Paulo. Enquanto os produtores debatiam, Zizek sugeriu: “Por que não fazem a entrevista comigo sentado numa privada? Dizem que eu falo muita m..., então é o lugar ideal!”. O episódio resume o espírito de seu protagonista: é um provocador que sabe manipular as aparências. Profundo e às vezes até incompreensível em seus textos, Zizek recorre com frequência a temas pop para explicar suas convicções. “Kung Fu Panda, por exemplo, tem toda aquela ideologia de kung fu por trás, mas é emblemático de nossa sociedade: tudo se resume à luta e à comida”, diz ele. O polemista admite que, às vezes, é provocador: “Eu gosto de complicar as coisas”. No Brasil para uma série de palestras e o lançamento de dois livros, Zizek recebeu ÉPOCA no saguão de um hotel de luxo em Copacabana, de frente para o mar. De jeans e camiseta, bem-humorado, afirmou que não existe sociedade completamente livre, defendeu um debate sobre o modelo econômico mundial e chamou o diretor David Lynch de idiota.

ÉPOCA – O senhor tem criticado a nova tendência de armazenar as informações em grandes computadores externos (as “nuvens”), e não mais nos computadores pessoais. Isso não é paranoia?
Slavoj Zizek – Não é para transformar em paranoia, mas é um perigo. O que eu digo é que pensamos na internet como um espaço público e aberto, mas ela não é isso. É um espaço privado. Gostamos de dizer que nosso uso da internet é aberto, em contraste, por exemplo, com o que é feito na China.

ÉPOCA – Mas qualquer um pode abrir um site, escrever o que quiser...
Zizek – E isso sempre estará vinculado a alguma empresa. É uma falsa ilusão de espaço público. É mais ou menos como um shopping: é público, mas existe exclusão. O espaço é controlado por uma empresa, está dentro de uma cúpula, controlado.

ÉPOCA – Então não somos livres?
Zizek – Tudo é permitido, mas nem tanto. Recentemente, na China, eles proibiram na TV histórias que tivessem viagens no tempo e realidades alternativas. A explicação oficial é que a história é uma coisa muito séria para ser submetida a esse tipo de ficção. Na verdade, eles têm medo de que as pessoas possam simplesmente pensar que a realidade poderia ser diferente. Aqui não temos esse tipo de controle, mas existem áreas onde não é possível pensar em realidades diferentes.

ÉPOCA – Quais?
Zizek – Nós achamos que quase tudo é possível na tecnologia. Viajar pelo espaço, clonar, fazer crescer órgãos, usar células-tronco. Mas, na economia, se você propuser qualquer alternativa, eles dizem: “Não! É impossível. Você não pode nem pensar nisso”. Até a esquerda aceita que a receita liberal, do jeito que é, está certa.

ÉPOCA – Isso não é um paradoxo, já que temos informações de todas as partes do mundo, ainda mais com a internet?
Zizek – Um exemplo: como a imprensa trata a questão do Oriente Médio? A imprensa vai lá quando algo está acontecendo. O ideal seria saber o que acontece lá quando nada está acontecendo. Como é a vida quando nada que interessa à mídia está acontecendo. Aí é que estará o verdadeiro horror. De repente, do nada, ocorre algo e a mídia vai correndo e todos se perguntam: “Por que aconteceu isso?”. Não deveríamos ser tão fascinados apenas pelo que está acontecendo. Olhe o que está por trás, o que acontece quando nada acontece.

ÉPOCA – A democracia e a liberdade de escolha nos protegem?
Zizek – A democracia funciona assim: é um pacto secreto entre as pessoas e a elite. As pessoas não querem decidir de verdade. Eles querem que alguém diga o que fazer, mas querem manter a aparência de que estão decidindo. Toda pessoa tem medo de decidir. É difícil ser realmente livre e decidir. É um pesadelo. Quer dizer que você tem de assumir completamente a responsabilidade.
"Nós achamos que quase tudo é possível
na tecnologia. Mas, na economia,
se você propuser qualquer alternativa,
eles dizem que é impossível"

PRODUÇÃO
Dois livros de Zizek lançados no Brasil.
Ele analisa a cultura contemporânea

ÉPOCA – O senhor já provocou polêmica ao dizer que Hitler não foi violento o suficiente. Acha que a liberdade é poder dizer coisas assim?
Zizek – Admito que eu gosto de provocar, mas não disse isso no sentido literal. As pessoas quase tiveram um ataque do coração quando eu disse que o problema de Hitler é que ele não foi violento o suficiente. Meu ponto é simples: Gandhi foi mais violento do que Hitler. A verdadeira violência é a violência da mudança social. Hitler fez o que fez para evitar uma mudança social. Nesse sentido, ele foi basicamente um covarde, mesmo tendo matado milhões.

ÉPOCA – O que o senhor acha das críticas a Lars Von Triers, que disse que entendia Hitler?
Zizek – Não devemos ser livres para celebrar Hitler, nada disso. Claro que Hitler fez coisas horríveis. No caso de Lars tem outra questão: o artista deve ser julgado pelo que ele faz. Eu odeio essa ideia de que, se você conversar com um diretor ou com um autor, você vai descobrir algo incrível, algum segredo. O que eles sabem está no que eles produzem. Muitos deles são idiotas. David Lynch, francamente, é um idiota. Ele está agora numa empreitada para coletar milhões de dólares para construir uma imensa cúpula de meditação porque ele acha que se mais de dez pessoas meditarem num lugar isso vai liberar energia que vai trazer paz ao mundo. Mas nos filmes ele é um gênio.

ÉPOCA – O senhor também já tentou resgatar reputações como a de Lênin e Robespierre. Por que defender figuras tão controversas?
Zizek – Eu disse claramente: Lênin está morto, o comunismo do século XX é passado, foi um fracasso. Eu apenas tentei entender a tragédia do comunismo. Uma imensa onda de liberdade e emancipação explodiu e terminou como um terror impensável. Estamos cientes do que a revolução de outubro trouxe em termos de emancipação, de liberdade. Falo da revolução em si. O que veio depois, veio depois. Eu não aceito a forma como algumas figuras são pintadas.

ÉPOCA – O que acha de Bin Laden?
Zizek – Lênin, Bin Laden, onde você vê conexão? É o oposto. Como Bin Laden veio? Bin Laden era como um agente da CIA. Os Estados Unidos criaram Bin Laden. O Afeganistão era o mais tolerante dos países do Oriente Médio. Tinha uma tradição de tolerância religiosa. Havia muçulmanos, budistas, inclusive visitavam uns aos outros. Para lutar contra os comunistas, os Estados Unidos se uniram aos fundamentalistas. Olhe para os Estados Unidos. O sistema deles gerou o fundamentalismo.
 
SLAVOJ ZIZEK
QUEM É
Slavoj Zizek, de 62 anos, é filósofo e crítico esloveno
O QUE FEZ
É autor de vários livros. Considera sua obra-prima A visão em paralaxe, sobre o deslocamento aparente de um objeto, quando, na verdade, quem mudou de posição foi o observador
O QUE PUBLICOU
Está no Brasil para lançar os livros Primeiro como tragédia, depois como farsa e Em defesa das causas perdidas, ambos pela editora Boitempo

Slavoj Zizek filósofo e teórico crítico esloveno.


Use suas ilusões contra os cínicos

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Use suas ilusões contra os cínicos
A razão por que a vitória de Obama gerou tamanho entusiasmo não está apenas em que, contra todas as chances, realmente aconteceu: ela demonstrou a possibilidade de que uma coisa dessas acontecesse. O mesmo vale para todas as rupturas históricas.
Noam Chomsky convocou as pessoas a votarem em Obama “sem ilusões”. Eu compartilho plenamente as dúvidas de Chomsky quanto às conseqüências reais da vitória de Obama: de uma perspectiva pragmática, é bastante possível que Obama faça algumas melhoras, tornando-se um “Bush com uma cara humana”. Ele seguirá as mesmas políticas básicas num modo mais atrativo e então efetivamente fortalecerá a hegemonia norte-americana, danificada pela catástrofe dos anos Bush.

Há, contudo, algo profundamente errado nessa reação – uma dimensão chave está faltando na vitória de Obama. É que não se trata apenas da eterna luta pela maioria parlamentar, com todos os cálculos pragmáticos e manipulações envolvidas. É um signo de algo mais. É por isso que um amigo meu norte-americano, um esquerdista radical sem ilusões, chorou quando as notícias anunciaram a vitória de Obama. Quaisquer que sejam nossas dúvidas, por um momento cada um de nós estava livre e participando da liberdade universal da humanidade.

No "Conflito das Faculdades", Kant faz uma pergunta difícil mas simples: há realmente progresso na história? (ele queria dizer progresso ético, não apenas desenvolvimento material). Ele concluiu que o progresso não pode ser provado, mas podemos discernir signos que indicam que o progresso é possível. A Revolução Francesa foi um signo desses, apontando a direção da possibilidade da liberdade: o que antes era impensável aconteceu, uma totalidade de pessoas afirmaram sua liberdade e igualdade corajosamente.

Para Kant, ainda mais importante que a – sempre sangrenta – realidade do que se passou nas ruas de Paris foi o entusiasmo que os eventos na França ofereceu aos olhos dos simpáticos observadores em toda a Europa e em lugares distantes como o Haiti, em que esses acontecimentos engatilharam outro evento histórico-mundial: a primeira revolta de escravos negros. Possivelmente o momento mais sublime da Revolução Francesa ocorreu quando a delegação haitiana, liderada por Toussaint l'Overture visitou Paris e foi entusiasticamente recebida pela Assembléia Popular como iguais dentre iguais.

A vitória de Obama é um signo da história no triplo sentido kantiano de signum rememorativum, demonstrativum, prognosticum. Um signo no qual a memória do longo passado de escravidão e da luta por sua abolição reverbera; e um evento que agora demonstra uma mudança; uma esperança para conquistas futuras. O ceticismo apresentado por trás das portas fechadas mesmo de progressistas angustiados – e se, na privacidade da cabine de votação, o racismo publicamente repudiado reemergisse? - provou-se errado. Uma das coisas interessantes a respeito de Henry Kissinger, o mais recente realpolitiker cínico é como a maior parte de suas previsões estava errada. Quando as notícias do golpe militar anti-Gorbachov de 1991 chegaram ao Ocidente, por exemplo, Kissinger imediatamente aceitou o novo regime como um fato. Ele colapsou ignominiosamente três dias depois. O cínico paradigmático conta a ti confidencialmente: “Mas não vês que tudo, na verdade, diz respeito a dinheiro/poder/sexo, que declarações de princípios ou de valores são apenas frases vazias que não contam para nada?" O que os cínicos não vêem é a sua própria ingenuidade, a ingenuidade de sua sabedoria cínica que ignora o poder das ilusões.

A razão por que a vitória de Obama gerou tamanho entusiasmo não está apenas em que, contra todas as chances, realmente aconteceu: ela demonstrou a possibilidade de que uma coisa dessas acontecesse. O mesmo vale para todas as rupturas históricas – pense na queda do muro de Berlim. Mesmo que todos nós soubéssemos da ineficiência corrupta dos regimes comunistas, não acreditamos realmente que ele iria se desintegrar – como Kissinger, éramos todos vítimas do pragmatismo cínico. A vitória de Obama era claramente previsível desde pelo menos duas semanas antes das eleições, mas ainda assim foi experienciada como uma surpresa.

A verdadeira batalha começa agora, depois da vitória: batalha pelo que essa vitória efetivamente significará, especialmente no contexto de dois eventos nefastos: o 11/9 e o atual derretimento financeiro, como uma instância da história que se repete, a primeira vez como tragédia, a segunda, como farsa. O discurso do presidente Bush aos norte-americanos depois do 11 de Setembro e depois do derretimento financeiro soaram como duas versões da mesma fala. Em ambos os momentos, ele evocou a ameaça ao american way of life e à necessidade de resposta rápida e decisiva. Em ambas as vezes, solicitou a suspensão parcial dos "valores americanos" (garantias para a liberdade individual, capitalismo de mercado) para salvar esses valores. De onde vem essa similaridade?

A queda do muro de Berlim em 9 de novembro de 1989 marcou o começo dos “felizes anos 90”. De acordo com Francis Fukyama a democracia liberal tinha, em princípio, vencido. A era é geralmente vista como tendo chegado ao fim em 11 de Setembro. Contudo, parece que a utopia teve de morrer duas vezes: o colapso da democracia política liberal em 11 de Setembro não afetou a utopia do capitalismo de mercado global, que agora chegou ao fim.

O derretimento financeiro tornou impossível ignorar a irracionalidade gritante do capitalismo global. Na luta contra a AIDS, a fome, a falta de água ou o aquecimento global, podemos reconhecer a urgência do problema, mas sempre é momento para refletir, para adiar decisões. A conclusão mais importante do encontro de líderes em Bali para conversar sobre mudança climática foi celebrada como um sucesso, a de que deveriam se encontrar de novo em dois anos para continuar as conversações.

Porém, com o derretimento financeiro, a urgência foi incondicional; uma soma além da imaginação foi imediatamente encontrada. Salvando espécies em extinção, salvando o planeta do aquecimento global, encontrando uma cura para a AIDS, salvando as crianças famintas...tudo isso pode esperar um pouco, mas “Salve os bancos!” é um imperativo incondicional que requer se tome providências imediatas. O pânico foi absoluto. Uma unidade transnacional e não-partidária foi imediatamente estabelecida, sem ressentimentos.

Compare os 700 bilhões de dólares gastos para estabilizar o sistema bancário só pelos EUA aos 22 bilhões de dólares suplicados às nações ricas para ajudar às pobres a superar sua crise alimentar, dos quais apenas 2,2 bilhões foram concedidos. A culpa pela crise alimentar não pode ser atribuída aos suspeitos usuais de corrupção, ineficiência ou intervencionismo estatal. Até Bill Clinton sabia que “somos todos culpados, inclusive eu”, ao tratar da produção de alimentos como commodities, no lugar de um direito vital dos países pobres. Clinton foi muito claro ao culpar não apenas estados ou governos, mas a política ocidental de longo prazo, imposta pelos EUA e pela União Européia e decretadas pelo Banco Mundial, FMI e outras instituições internacionais.

Países da África e da Ásia foram pressionados a derrubar os subsídios governamentais aos produtores, abrindo o caminho para que as melhores terras fossem usadas no lucrativo plantio para exportação. O resultado desse tipo de “ajuste estrutural” foi a integração da agricultura local na economia global: safras foram exportadas, agricultores foram expulsos de suas terras e levados ao trabalho em condições de escravidão, e os países mais pobres tiveram de importar cada vez mais comida. Dessa maneira, foram postos numa dependência pós-colonial, vulneráveis a flutuações de mercado – preços exorbitantes de grãos (causados em parte pelo uso para os biocombustíveis) têm significado fome nesses países, do Haiti a Etiópia.

Clinton está certo ao dizer que “comida não é uma commoditie como as outras. Deveríamos retomar uma política de auto-suficiência alimentar. É loucura para nós pensar que podemos desenvolver países ao redor do mundo sem aumentar sua capacidade de alimentarem a si mesmos”. Há pelo menos duas coisas a acrescentar aqui. Primeiro, os países desenvolvidos do Ocidente tomaram muito cuidado em manter sua própria auto-suficiência alimentar através do subsídio financeiro aos seus produtores (subsídios agrícolas constituem quase metade de todo o orçamento dos EUA). Segundo, a lista de coisas que “não são commodities como as outras” é muito maior: afora os alimentos (e a defesa, como todos os patriotas sabem), há água, energia, meio-ambiente, cultura, educação, saúde – quem tomará decisões quanto a essas coisas, se elas não podem ser deixadas para o mercado? É aqui que a questão do comunismo tem de ser levantada, de novo.

A matéria de capa na Time de 5 de junho de 2006 foi “A Lista de Mortos em Guerra no Mundo” - um relato detalhado da violência política que matou 4 milhões de pessoas no Congo ao longo da última década. Nenhuma onda de ajuda humanitária se seguiu; só umas duas cartas de leitores. Time escolheu a vítima errada: deveria ter mirado em mulheres muçulmanas ou em monges tibetanos. A morte de uma criança palestina, para não mencionar a de uma israelense ou norte-americana, vale milhares de vezes mais centímetros de colunas do que a morte de congoleses anônimos. Por que?

Em 30 de outubro, a Associated Press fez uma reportagem na qual Laurent Nkunda, o general rebelde que sitiou a capital da província do leste, Goma, disse que ele queria falar diretamente com o governo sobre suas objeções à ajuda de um bilhão de dólares dada pela China para ter acesso à vasta riqueza mineral do país em troca de ferrovias e rodovias. Questões neocoloniais à parte, esse acordo põe uma ameaça vital aos interesses dos senhores da guerra locais, à medida que cria as bases para a infra-estrutura da República Democrática do Congo como um estado unido funcional.

Em 2001, uma investigação da ONU sobre a exploração ilegal de recursos naturais no Congo descobriu que o conflito no país gira fundamentalmente em torno do acesso, controle e comercialização de cinco minerais-chave: coltan (combinação de duas palavras que descrevem a columbita e a tantalita, minerais altamente cobiçados), diamantes, cobre, cobalto e ouro. De acordo com essa investigação, a exploração dos recursos naturais no Congo pelos senhores da guerra locais e por exércitos estrangeiros era “sistemática e sistêmica”. O exército de Ruanda fez no mínimo 250 milhões de dólares em 18 meses, vendendo coltan, que é usado para fazer celulares e laptops. A investigação concluiu que a guerra civil permanente e a desintegração do Congo “criaram uma situação em que todos os beligerantes ganham. O único a perder nesse negócio monumental é o povo congolês”. Por trás da fachada de uma guerra étnica, discernimos então os contornos do capitalismo global.

Entre os grandes exploradores estão os Tutsis de Ruanda, as vítimas do genocídio há 14 anos. No começo deste ano, o governo de Ruanda publicou documentos que demonstravam a cumplicidade da administração Miterrand com o genocídio: a França apoiou o plano Hutu para tomar o controle, inclusive fornecendo-lhes armas, a fim de retomar a influência perdida pelos anglófilos Tutsis. A negação da França dessas acusações, como sendo totalmente infundadas foi, para dizer o mínimo, ela mesma sem fundamento. Trazer Miterrand para o Tribunal de Haia, mesmo postumamente, quebraria uma barreira fatal, ao julgar um líder político ocidental que se pretendia protetor da liberdade, da democracia e dos direitos humanos.

Nas últimas semanas tem havido uma extraordinária mobilização da ideologia dominante para combater as ameaças à ordem atual. O economista neoliberal francês Guy Sorman, por exemplo, disse recentemente numa entrevista na Argentina que “a crise será bastante curta”. Ao dizer isso, Sorman está obedecendo à exigência básica no que concerne ao derretimento financeiro: renormalizar a situação. Como ele disse num outro lugar, essa substituição sem fim do velho pelo novo – conduzida pela inovação tecnológica e pelo empreendedorismo, eles próprios encorajados pelas boas políticas econômicas – trazia prosperidade, mesmo que aqueles deslocados pelo processo cujos empregos se tornaram redundantes possam, compreensivelmente, oferecer-lhe objeção. (Essa renormalização coexiste com seu oposto: o pânico das autoridades em tornar o público pronto a aceitar a solução – obviamente injusta – proposta como inevitável.) Sorman admite que o mercado é cheio de comportamento irracional, mas rapidamente acrescenta que “seria absurdo usar o comportamento econômico para justificar a restauração das excessivas regulações estatais. Afinal de contas, o estado não é mais racional que o indivíduo, e suas ações podem ter consequências enormemente destrutivas”. Ele continua:

Uma tarefa essencial para os governos democráticos e para os construtores de opinião, quando confrontados com ciclos econômicos e pressões políticas é assegurar e proteger o sistema que tem servido tão bem à humanidade, e não mudá-lo para pior, sob o pretexto de sua imperfeição. Ainda, essa lição é sem dúvida uma das mais difíceis de traduzir na linguagem em que a opinião pública aceitará. O melhor dos sistemas econômicos possíveis é na verdade imperfeito. Quaisquer que sejam as verdades descobertas pela ciência econômica, o livre mercado é afinal apenas o reflexo da natureza humana, ela mesma dificilmente perfeita.

Raramente a função da ideologia foi descrita em termos tão claros: para defender o sistema existente contra quaisquer críticas sérias, legitimá-lo como uma expressão direta da natureza humana.

É improvável que o derretimento financeiro de 2008 funcione como uma bênção aparente, o despertar de um sonho, uma lembrança sóbria de que vivemos na realidade do capitalismo global. Tudo isso depende de como será simbolizado, em que interpretação ideológica ou histórica vai se impor e determinar a percepção geral da crise. Quando o curso normal das coisas é traumaticamente interrompido, o campo é aberto para uma competição ideológica “discursiva”. Na Alemanha de fins dos anos 20, Hitler venceu a competição para determinar qual narrativa explicaria as razões da crise na República de Weimar e o modo de sair dela; na França em 1940 a narrativa do marechal Pétain venceu a batalha para encontrar as razões da derrota francesa.

Conseqüentemente, para pôr em termos marxistas fora de moda, a tarefa principal para a ideologia dominante na atual crise é impor uma narrativa que não jogará a culpa pelo derretimento no sistema do capitalismo global como tal, mas em seus desvios – regulação frouxa, corrupção das grandes instituições financeiras, etc.

Contra essa tendência, deveria insistir-se na questão-chave: qual “o defeito” do sistema que o torna de tal modo vulnerável à possibilidade dessas crises e colapsos? A primeira coisa a ter em mente aqui é que a origem da crise é “benevolente”: depois da bolha tecnológica de 2001, a decisão nas agendas dos partidos foi a de facilitar o estado real dos investimentos, a fim de manter a economia funcionando e de evitar recessão – o derretimento dos dias atuais é o preço pelo EUA ter evitado uma recessão sete anos atrás.

O perigo é, então, que a narrativa predominante do derretimento não seja uma que nos acorde de um sonho, mas que nos permita continuar sonhando. E é aqui que deveríamos começar a nos preocupar: não apenas com as conseqüências econômicas do derretimento, mas com a óbvia tentação de revigorar a “guerra ao terror” e o intervencionismo norte-americano para que a economia continue funcionando. Nada foi decidido com a vitória de Obama, mas ela amplia nossa liberdade e, portanto, o objetivo de nossas decisões. Não importa o que aconteça, permanecerá um signo de esperança, na contramão desses tempos de trevas; um signo de que a última palavra não pertence ao cínico realista, da direita ou da esquerda.

Publicado originalmente na London Review of Books, em 14 de novembro de 2008

*Slavoj Zizek é filósofo e psicanalista. Também é co-dirigente do International Centre for Humanities at Birkbeck College. Seu livro mais recente é In Defence of Lost Causes [Em Defesa das Causas Perdidas] (Verso). Tem vários trabalhos publicados no Brasil, entre eles, Às Portas da Revolução – escritos de Lenin de 1917 e Bem-vindo ao deserto do real, ambos pela Boitempo Editorial.

Tradução: Katarina Peixoto

Fonte: Agência Carta Maior

AUMENTO DE SALÁRIO DE VEREADORES DE CAMPINAS EM 126%.


Campinas, 12 de Dez de 2011, 21:20. MAIOR SENTIMENTO DE REVOLTA, IMPOTÊNCIA E NOJO QUE JÁ SENTI NA VIDA. Cheguei agora da Câmara, onde os vereadores de Campinas acabaram de votar o aumento de 126% no próprio salário. O ABSURDO FOI TÃO GRANDE! Tudo que era votado eles apresentavam o número da proposta e o nome, nessa eles falaram apenas o número, não o nome, e ainda por cima, alguns assessores no meio da platéia fizeram uma massa de manobra do Campo Grande começar a gritar "MACROZONA 5", que tava sendo discutida antes (de propósito, claro). Resultado: mal percebemos o que estava acontecendo e o aumento já tinha sido aprovado! Por 28 votos contra 2!!!!!!!!! Em seguida começamos as palavras de ordem "VERGONHA", entre muitas outras, e alguns jogaram ovos. Aí a guarda municipal veio pra cima com gás de pimenta e máquina de choque. 3 foram para a delegacia. A confusão foi geral, o clima era de revolta, de indignação. Gritamos para a polícia: "EI, SARGENTO, DE QUANTO FOI O SEU AUMENTO?" e "VOCÊ, FARDADO, TAMBÉM VAI SER ROUBADO!". E os bonitos dos vereadores, atrás da polícia, saíram RINDO DA NOSSA CARA, MANDANDO BEIJINHO, E O POLITIZADOR AINDA FEZ AQUELE GESTO COM AS MÃOS EM BAIXO DO BRAÇO, SABE? COMO QUEM DIZ "MAMATA". Eu sei que ele votou contra, MAS ELE FEZ ISSO! E todos estavam rindo da nossa revolta. Que nojo dessa escória da humanidade. GALERA, A ÚNICA COISA QUE PODEMOS FAZER É, NAS PRÓXIMAS ELEIÇÕES, LEMBRAR QUE APENAS 2 VEREADORES VOTARAM CONTRA ESTE ABSURDO. NENHUM DELES MERECE SER REELEITO. Será que vai dar pra lembrar disso? Ah, vai passar no jornal. Até eu dei entrevista na EPTV. Tô com dor de estômago de tanta raiva. POR FAVOR COMPARTILHEM PARA TODO MUNDO SABER O ABSURDO QUE FOI ARMADO POR ESSES PICARETAS. A FOTO FOI TIRADA DEPOIS DA CONFUSÃO. E PRA QUEM DUVIDOU DO QUE EU FALEI O QUE O POLITIZADOR FEZ: http://www.rac.com.br/multimidia/imagens/2011/12/12/montagem-votaram-contraG.jpg
ATUALIZAÇÃO: agora o presidente da câmara vem dizer que a população está desinformada, pq o aumento será compensado por uma redução da verba de gabinete. meu querido, se dá pra reduzir a verba, reduz e não aumenta o salário em 126%, o momento é de economizar!!!! além disso, a redução não vai ser do mesmo valor do aumento, será menor!! isso ele não disse (e estamos tão bem informados que já sabemos)! além disso ele disse q a função do aumento é tornar o salário atrativo. por que não tornamos o salário mínimo atrativo então? salário atrativo tem que ser o de professor!

PRIVATARIA TUCANA / LAVAGEM DE DINHEIRO.


O livro PIRATARIA TUCANA do jornalista Amaury Ribeiro Junior denuncia o PSDB em esquema de lavagem de dinheiro em paraisos fiscais no caribe. Entre outros, Serra e família são os mais beneficiados na propina. O governo de Fernando Henrique Cardoso, à epoca, era de corrupção escondida através das privatizações. Na entrevista concedida ao jornalista Paulo Henrique Amorim o Amaury Ribeiro abre o jogo e denuncia.