segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Entrevista com Peter Singer


Ele é a favor do aborto e condena que se mate animais para comer. O filósofo Peter Singer, professor de bioética na Universidade de Princeton, vegetariano há 35 anos, um dos mais polêmicos pensadores da área. Mas diz que sua filosofia é muito simples: “Evitar o sofrimento ao máximo, para seres humanos e animais”.

Época: Não comer carne sempre foi uma questão ética para o senhor?
Peter Singer: Eu me tornei vegetariano faz 35 anos. Naquela época, esse tema era totalmente ignorado pelos filósofos. Toda a questão moral em torno do tratamento de animais não existia para a filosofia. Mas, para mim, essa já era uma questão ética .

Época: Qual é exatamente a sua posição?
Peter Singer: Não acho que seja justificável submeter animais a sofrimento só porque gostamos do sabor da carne ou porque estamos acostumados. Mas, infelizmente, é isso que a gente faz quando compra um animal para comer. Gostaria de esclarecer que isso só se aplica a pessoas que têm o suficiente para uma dieta saudável composta só de vegetais. Nunca disse que populações em condições de pobreza, que precisam comer o que puderem para se nutrir, deveriam ser vegetarianas. Quem tem outras opções, no entanto, se continuar a consumir carne, especialmente carne produzida segundo os métodos modernos de criação de gado, será responsável por submeter os animais a um grande sofrimento.

Época: O homem não é onívoro por natureza?
Peter Singer: Não sei o que isso dizer. Se quer dizer que não podemos fazer outra coisa, com certeza, isso não é verdade. Há muitos milhões de pessoas que não comem animais. Se quer dizer que essa é a forma como sempre fizemos, é verdade. Mas é irrelevante para determinarmos o que fazer agora.

Época: Na natureza animais comem outros animais.
Peter Singer: Isso não é um argumento. Na natureza, o homem domina a mulher, um homem escraviza o outro. Ninguém argumenta que essas coisas sejam certas.

Época: O que seria um argumento moral válido?
Peter Singer: Um argumento moral tem de ter algumas premissas, deve ser algo que nos guia.

Época: Quem determina as premissas que devemos seguir?
Peter Singer: Ninguém determina. Cada um de nós determina para si próprio. Devemos fazer isso pensando claramente sobre o que fazemos, nos perguntando, por exemplo, se gostaríamos que fizessem conosco o que fazemos com o outro.

Época: Seu pensamento ético se encaixa em alguma escola filosófica ou tradição moral?
Peter Singer: Minha visão moral vem da filosofia utilitária desenvolvida por filósofos ingleses como Jeremy Bentham and John Stuart Mill no do século 19. Mas não acho que, essencialmente, meus argumentos pelo vegetarianismo sejam utilitários. São uma extensão de pensamentos que a maioria das pessoas tem, como a rejeição ao racismo. Uma extensão disso é o que eu chamo de especiesmos, preconceito contra aqueles que não são membros da nossa espécie.

Época: Esse preconceito se volta só contra algumas espécies? Por que comemos bois e porcos e não comemos gatos e cachorros?
Peter Singer: Algumas pessoas comem gatos e cachorros. Isso é cultural. No ocidente, nós não comemos gatos e cachorros, mas, ainda assim, somos preconceituosos em relação a eles. Muitas vezes eles são muito maltratados.

Época: Um dos argumentos que o senhor coloca para não comermos animais é que eles são auto-conscientes. Todo animal é consciente de si mesmo?
Peter Singer: Não. Os animais são conscientes no sentido de que são capazes de sentir dor, pelo menos a maioria (ostras não devem sentir nada). Mas não acredito que todos sejam conscientes de si mesmos. É difícil saber. Eu nunca disse que galinhas, por exemplo, têm consciência de sua existência. Mas elas sentem dor.

Época: O senhor comeria ostras?
Peter Singer: Acho que tudo bem comer uma ostra. Não creio que ostras sintam dor.

Época: Algumas pessoas dizem que plantas têm sentimentos.
Peter Singer: Não há nenhuma evidência de que isso seja realmente verdade.

Época: E se a ciência provar que é verdade?
Peter Singer: Se a ciência provar que é verdade, precisaremos arrumar formas de reduzir esse sofrimento. Claro que teremos de comer alguma coisa. Mas é sempre bom lembrar que quando comemos animais somos responsáveis por destruir cinco ou dez vezes mais plantas do que se as comêssemos diretamente. Portanto, as plantas serem capazes de sofrer ainda não seria uma razão para comer animais.

Época: É mais ético caçar do que criar animais?
Peter Singer: De alguma forma, sim, porque os animais têm uma vida normal. E, se o caçador tiver boa pontaria, eles morrem instantaneamente e não sofrem. É muito melhor do que ir a um supermercado e comprar um pedaço de carne que vem de uma fazenda de produção industrial, onde os animais provavelmente sofreram por toda a sua vida.

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